sábado, julho 10, 2010

A anarquia no Ministério da Educação e a fusão de Agrupamentos de Escolas nas notícias - XXXV

Deslocalização
Educação
por António Amaral
(Presidente da FERSAP)

Primeiro foram as escolas com menos de 10 alunos. Fizeram-se obras em outras escolas para acolher as crianças deslocadas. Agora são as escolas com menos de 21 alunos que fecham. E, no futuro, serão fechadas as aldeias com menos de 10 habitantes, primeiro, no ano seguinte as com 21 e por aí fora. Fecha tudo. Faz lembrar o fecho de fábricas que foram transferidas para o estrangeiro, dito prosaicamente de deslocalização.

Desloca-se tudo, em prol da modernidade, ou seja, para hipoteticamente se poupar dinheiro ao Estado para se poder fazer, por exemplo, mais uma auto-estrada Lisboa – Porto.

Diz o patriota Sócrates que é tudo para a melhoria da qualidade da educação e combate ao insucesso escolar. Afirmou mesmo que seria “criminoso” não encerrar escolas com menos de 20 alunos (Público, de 6 de Junho de 2010). Já sobre a desertificação do interior e à total ausência de políticas para desenvolver o mundo rural e fixar as populações ao seu meio, nem uma palavra, quanto mais uma medida, isto num país que importa 80% do que consome.

As aldeias que perdem a escola perdem parte do seu valioso património e população. Os jovens casais vão morar para perto das escolas onde podem deixar os seus filhos, o pequeno comércio da terra perde clientes, definha e fecha. Ficam apenas os mais idosos, sós e isolados. É como se as aldeias fossem deslocalizadas para os grandes centros urbanos. Em muitas aldeias raianas os portugueses já vão a Espanha, quer para tomar um simples café, quer para abastecerem-se ou irem ao centro de saúde! Qualquer dia, porém, já não vão... porque a aldeia fechou. Acentuam-se as assimetrias entre o interior e o litoral, mas isso não é criminoso!

A par do fecho do país rural outro crime se está a cometer contra a escola pública com o dito reordenamento da rede – a absurda criação dos mega-agrupamentos, também conhecida pela “mega-hipocrisia”!

Recebi hoje de uma associação de pais de uma escola do concelho do Seixal um e-mail que transcrevo: “Não estou a ver… o nosso agrupamento tem 1800 crianças, juntar a uma secundária, estaremos a falar de cerca de 4000 crianças, o que é que estes meninos passarão a ser, números? Se já é difícil gerir 1800 como será com 4000? E o nosso trabalho no Conselho Geral foi para o boneco? O que é que a Sr.ª Ministra espera dos pais?”

Os pais estão apreensivos e com razão. Então há um ano elegemos um director, aprovamos um regulamento interno e um projecto educativo e todo este trabalho é atirado fora? Será que os burocratas do Governo sabem, ou imaginam sequer, o que são milhares de horas em horários pós-laborais dados (sem remuneração, saliente-se!) por membros da comunidade educativa nos conselhos gerais? Bastaria isto para classificar como total desrespeito a imposição dos mega-agrupamentos.

Mas a questão é muito mais grave. A retórica económica usada para impor estas super-estruturas esconde a intenção de entregar o ensino a grupos privados, tal como está a acontecer no sector da saúde com a entrega da gestão de hospitais e serviços públicos à gestão privada.

Entre outros malefícios dos mega-agrupamentos salientamos a mais que provável alteração do papel pedagógico do director para funções burocráticas da gestão do “monstro”, a qualidade do ensino vai ainda baixar mais e, também, a ligação e comunicação família/escola vai piorar, com consequências nefastas para o papel dos pais na educação.

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